21 dezembro 2010

Randolfe Rodrigues - discurso proferido na diplomação

O AMAPÁ, O SENADO E OS DESAFIOS PARA O FUTURO:

FÉ NO QUE VIRÁ!

Randolfe Rodrigues

“As terras da Capitania do Cabo do Norte, além de serem elas sós maiores que toda a Espanha junta, e haver nelas muitas notícias de minas, têm pela maior parte o solo mais fértil e para dar maiores proveitos e melhores frutos do que quantas há neste imenso rio das Amazonas”.

(Christoval de Acunã, padre jesuíta do século XVII, descrevendo as terras que hoje chamamos de Amapá).

O Amapá ou Yamapaba como era chamada pelos tupis, o lugar da chuva, viveu experiências distintas nos últimos séculos decorrentes de suas singularidades: A disputa por estas terras entre os Estados Europeus no século XVII, a consolidação da ocupação portuguesa no século XVIII com as experiências urbanas da Vila Vistosa da Madre de Deus, Mazagão e Estância das Bacabas, atual Macapá.

No século XIX, com o descaso do Governo central e com as experiências da corrida do ouro e da República do Cunani, os amapaenses se forjaram BRASILEIROS. Nós somos um recanto deste imenso país que se tornou brasileiro pela vontade de ser brasileiro. Aqui homens e mulheres sacrificaram-se baixando a bandeira francesa e erguendo o pavilhão nacional.

No século XX, veio o estabelecimento da infra estrutura estatal com a instituição do território e quarenta e cinco anos depois com a criação do Estado.

Assumimos a condição de unidade federada da república brasileira. Enfrentamos o desafio do enorme salto demográfico da última década do século passado, a propósito, os ciclos migratórios do século XX nos tornaram o mais brasileiro dentre os Estados brasileiros, 70% do nosso povo, são imigrantes ou filhos de imigrantes. Em nenhum outro lugar é tão concreta a síntese de Darcy Ribeiro:

Nós, brasileiros, nesse quadro, somos um povo em ser, impedido de sê-lo. Um povo mestiço na carne e no espírito, já que aqui a mestiçagem jamais foi crime ou pecado.(...)

Daqui há alguns dias estaremos na segunda década do século XXI, este tempo que virá encontra o Amapá e o seu povo diante de desafios históricos. A nossa economia ainda é profundamente dependente do setor de comércio e serviços que representa 86% do nosso PIB. Metade de todas as riquezas que produzimos provém da administração pública (46,5%). Urge o imperativo de superarmos a fase mercantil e estatal e dar o salto para o desenvolvimento industrial sem aceitar qualquer modelo predatório ao fantástico e belíssimo patrimônio natural que possuímos.

O Amapá vive hoje a mais dramática crise econômica, fiscal e moral de todos os tempos.

Quem tem sofrido com esta CRISE são os mais pobres. São as mães da bolsa família, os jovens do Amapá Jovem, os trabalhadores dos caixas escolares que estão há três meses sem remuneração e são milhares de amapaenses que tem sofrido com a precarização da infra estrutura e dos programas sociais.

Entretanto é justamente na CRISE que se encontra a perspectiva dialética de fim e recomeço. Crise vem de kir ou krl, que significa limpar e purificar. Daí deriva a palavra crisol, elemento químico purificador do ouro e outros metais, ou acrisolar, que quer dizer purificar e depurar. Todo processo de purificação implica morte e renascimento. Tudo que passa pela crise permanece e tem essências que fundam um novo futuro.

As eleições de 2010 representaram um recado firme e incontestável bradado das urnas: MUDANÇA! Quando o sentimento de ser amapaense foi aviltada. O povo do Amapá não se desesperou nem cruzou os braços. se ergueu e disse BASTA! E naquele domingo, 03 de outubro, ficou determinado para todos nós que temos o dever de honrar a confiança do povo. Ainda naquele memorável domingo de sol 203.259 cidadãos amapaenses me honraram com sua confiança. De apenas uma ideia de um grupo político, o movimento ganhou corpo e se transformou em um projeto da maioria da sociedade. Como diria Verlaine, poeta francês do século XIX: “Com êxtase e o medo de haver sido o escolhido”, entrego-me hoje, ao serviço de representar nosso Estado na casa da Federação brasileira. Nesta hora, de forte exigência interior, recorro a memória do carinho do povo amapaense comigo, na fé que depositaram na nossa futura atuação no senado da república. Como é dito em hebreus, versículo 11, “A fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que não se vêem.” É a esta memória com sua inspiração, que recorrerei se a tentação do desalento vier a assaltar-me.

Um dos principais desafios do nosso mandato será a luta por recursos para o Amapá e pela recuperação do nosso orgulho de ser amapaenses.

Buscaremos reverter nossa posição de última das Unidades da Federação no acesso a recursos de transferências voluntárias da União. Comparando, o Estado de Roraima, que está um posto à nossa frente, recebeu do Governo Federal uma vez e meia a mais do que o Amapá nos últimos dez anos. Apoiaremos todos os elos para a obtenção destes recursos financeiros tão necessários ao nosso Estado; desde a garimpagem das fontes disponíveis nos Ministérios, à alocação de emendas individuais e de bancadas. Desde o acompanhamento para a liberação do recurso ao apoio à parte técnica de elaboração de projetos com a agilidade e a qualidade que devem ter para que o dinheiro público seja bem empregado.

O nosso Brasil é um país de profundas desigualdades. Desigualdade social e desigualdade regional. Ainda vivemos em uma federação que põem em cheque sua própria existência, priorizando o desenvolvimento nacional no centro sul. O incentivo à produção do saber científico é um exemplo que denuncia isso: da totalidade de Mestres e Doutores que atuam no ensino superior no Brasil: 69% estão nas regiões sul e sudeste. A nossa Amazônia corresponde a menos de 10% dos doutores brasileiros.

Por isso teremos à nossa frente imensos desafios de rediscutir o pacto federativo. O Supremo Tribunal Federal já determinou que o prazo de validade da esdrúxula fórmula de repartição do Fundo de Participação dos Estados tem data certa para terminar: 31 de dezembro de 2012. O Amapá é injustiçado nesta partilha do fundo que deveria reduzir as disparidades regionais e compensar os Estados com menor capacidade de arrecadação, como o nosso.

Não é isso que ocorre hoje, estamos em 14º lugar entre as unidades da federação, atrás de Estados bem mais desenvolvidos que, obviamente, necessitam menos do FPE. Para conseguirmos fazer justiça redistributiva ao Amapá não hesitaremos em enfrentar o gigantesco lobby das grandes potencias políticas e econômicas do Brasil.

Estes recursos serão decisivos para retirarmos o Amapá da incômoda posição de pior Estado em infraestrutura do país. Temos os piores indicadores do país em rodovias, em abastecimento de água tratada, em coleta e tratamento de esgoto, em aparelhos urbanos nas nossas cidades, em Energia elétrica. Este último item, aliás, caminha para a solução da geração com o Amapá se tornando potência geradora de energia hidrelétrica, mas permaneceremos como um “gigante com os pés de barro” enquanto não solucionarmos o problema da nossa empresa distribuidora, a CEA. Sem enfrentarmos e resolvermos estes gargalos da infraestrutura, não há como se falar em desenvolvimento econômico.

Nenhuma civilização avançou sem investimento no conhecimento, por isso nos dedicaremos a recuperação e a buscar investimentos para nossa Universidade Federal, a fim de retira-la da vergonhosa condição de última das Instituições Federais de Educação Superior da Amazônia em investimentos.

Nos comprometemos a atuar com destaque nas grandes questões nacionais, orgulhando a cada um dos que aqui nasceram e escolheram o Amapá para morar..

Na Reforma Tributária nosso empenho será para promover justiça fiscal. No Brasil a carga tributária é muito mais pesada para os menos favorecidos do que para os mais ricos. Aqui se pratica um flagrante processo de tributos regressivos, porque se prefere onerar bens, serviços e salários, por falta de determinação histórica em se tributar o patrimônio e a renda. A estrutura tributária complexa e burocrática expulsa empresas da formalidade e condena milhões de brasileiros ao subemprego indigno.

Nossa luta será por uma reforma tributária que desonere os mais pobres, favoreça as regiões periféricas sem perda de autonomia dos Estados, reafirmando que não aceitaremos, sob o falso pretexto da modernidade, a retirada de nenhum único direito dos trabalhadores, conquistado na luta histórica dos operários.

Na Reforma Política, que urge entrar na pauta nacional, lutaremos para ampliar a participação do POVO, fortalecendo os mecanismos de democracia direta e destruindo os entulhos caudilhescos que, lamentavelmente, ainda povoam os partidos e a política no nosso país.

Nos propomos a ser um Senador Amazônida, com muito orgulho! Sabemos da importância atual e futura da Amazônia, para o Brasil e para o Planeta. Rejeitamos a redoma de vidro preservacionista que interesses estrangeiros querem nos impor, com a mesma veemência que também recusamos o crescimento econômico à custa da depredação ambiental sem limites. A única alternativa para Amazônia é o desenvolvimento com sustentabilidade ambiental, economicamente inclusivo e socialmente justo.

Nosso mandato será um bastião da luta e uma caixa de ressonância dos legítimos movimentos sociais, nos quais com muita honra me formei como político, desde o movimento estudantil!

Seremos intolerantes com a corrupção, talvez o maior dos desafios do Brasil de hoje!

Será um mandato SOCIALISTA a serviço da causa humanitária de um mundo de PAZ e JUSTIÇA.

SOCIALISMO! UTOPIA? Sim, e que pode se transformar em realidade. Afinal nascemos para isso, para superar os limites e as situações que nos desumanizam e encontrar os caminhos da nova humanidade, aquela que construímos com a nossa ação.

Aprendemos com o nosso POVO e com nossos PAIS. A Importância da HUMILDADE. Foi conversando e aprendendo com o POVO que chegamos nos postos que hoje somos diplomados é da mesma forma que devermos nos comportar no exercício dos nossos mandatos.

SER HUMILDE é negar a cultura da vaidade a serviço da felicidade privada. É ser arauto do realismo utópico, do inédito viável: reavaliar, reeducar, reestruturar, reciclar, reduzir, redistribuir, redemocratizar.

As páginas dos livros do futuro abrem-se agora para nós é chegado o momento de escrevê-lo. E escrever um futuro melhor para todos só é possível com o espírito desarmado, com sentimento de unidade pelo bem coletivo e com a responsabilidade de saber separar o que é interesse da sociedade do que é interesse dos indivíduos que fazem da política seu mister. Escrever bem o futuro só é possível quando nos permitimos, no exercício da política sermos maiores do que nossas diferenças partidárias e nossos interesses momentâneos.

Por fim assumimos aqui compromissos. COMPROMISSO COM A ESPERANÇA DO POVO, nestes tempos de tamanho desalento. No dizer de Frei Betto: “Se a fé vê o que existe, a esperança vê o que existirá. E ele acrescenta: o amor só ama o que existe, mas a esperança ama o que existirá...

Os nossos antepassados construíram neste canto do planeta, ensolarado e úmido, onde o estuário do Amazonas e a linha divisória do globo se encontram uma belíssima civilização. Eles sonharam e emprestaram o seu sacrifício para que as gerações futuras vivessem com dignidade. Pedimos emprestado de Lênin a sua belíssima definição de SONHOS para AFIRMAR neste MOMENTO SOLENE NOSSA CONVICÇÃO NA REALIZAÇÃO DOS SONHOS DAQEUELES QUE NOS ANTECEDERAM: “É PRECISO SONHAR, MAS COM A CONDIÇÃO DE CRER EM NOSSO SONHO, DE EXAMINAR COM ATENÇÃO A VIDA REAL, DE CONFRONTAR NOSSA OBSERVAÇÃO COM NOSSO SONHO, DE REALIZAR ESCRUPULOSAENTE NOSSA FANTASIA. SONHOS, ACREDITE NELES.”

EM OUTUBRO DE 2010 O POVO DO AMAPÁ VOTOU PELA MUDANÇA! QUE NÓS SEMPRE POSSAMOS OUVIR O CLAMOR DO POVO.

FÉ EM Deus,

FÉ NO POVO DO AMAPÁ,

FÉ NA VIDA,

FÉ NO QUE VIRÁ!



·Senador eleito pelo PSOL-Ap. Discurso no evento de diplomação ao cargo de Senador da República.

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