19 setembro 2010

Plínio 50 do PSOL e o salário mínimo

Afrânio Boppré
Economista e secretário geral do PSOL


A eleição presidencial sofreu um apagão de idéias. Prometeu discutir os problemas nacionais, mas gradativamente fugiu da grande pauta e caiu na coisa menor. Faltando poucos dias para a eleição o debate resume-se ao dilema houve ou não quebra de sigilo fiscal da filha de um dos candidatos. É óbvio que condenamos esse tipo de prática, mas esse tema não pode substituir o debate sobre o Brasil e o seu povo. Também volta ao centro das atenções mais escândalos de corrupção do governo Lula o que levou a mais uma queda de ministro – desta vez Erenice da Casa Civil. Assuntos como o que pretendo abordar aqui perdeu infelizmente vigor. Mas por teimosia aí vai uma leitura e ao mesmo tempo proposta para o tratamento do tema “salário mínimo” pela candidatura presidencial do PSOL - Plínio 50. Esta reflexão é uma contribuição que tem no autor seu único responsável – para o mal ou para o bem (se houver).

O Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-econômicos) atualizou a série histórica do salário mínimo trazendo seus preços para o mês de junho de 2010. Este importante trabalho do Dieese nos revela muitas coisas. Levando em consideração que o salário mínimo passou a viger em julho de 1940 por iniciativa do presidente Getúlio Dorneles Vargas, temos que, o mesmo, atualizado a preços de julho de 2010, nasceu valendo R$ 1.126,57, isto é, 120% maior do que o salário mínimo que vigora hoje (R$ 510,00). Os dados foram deflacionados mês-a-mês o que nos permite uma avaliação minuciosa.

Já no governo de Juscelino Kubitschek de Oliveira (1956 – 61) o salário mínimo alcançou o seu maior poder de compra que também convertido a preços de 2010 representa R$ 1.623,18 ou ainda 218% maior que o praticado no Brasil atualmente. Esta marca foi recorde em sua trajetória – da criação aos dias atuais não se tem valor maior ao de janeiro de 1959.

A história do salário mínimo no Brasil é uma gangorra. Momentos de ascensão do seu poder de compra e períodos de declínio de modo que chegou ao fundo do poço em abril de 1992 no governo de Fernando Collor de Mello (1990 – 92) valendo segundo o Dieese R$ 191,18.

A nossa constituição sempre assegurou critérios para a definição do salário mínimo. A constituição atual que foi promulgada em 1988 tem em seu artigo sétimo inciso IV que o salário mínimo deveria ser aquele "capaz de atender a suas [do trabalhador] necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social". Ora, se levado a termo o preceito constitucional, facilmente podemos concluir que o salário mínimo está longe da realidade na medida em que não consegue com seu valor atual satisfazer as necessidades relacionadas na Carta Magna. Outra conclusão, agora jurídica, é que o salário mínimo fixado é inconstitucional.

Se deixarmos de lado os valores do salário mínimo expressos em pecúnia e adotarmos o número índice da série histórica do Dieese temos outra forma de ver a mesma flutuação. Isto é, se consideramos que na data da criação ele valia 100 (índice) e que no seu ápice como já localizamos acima (janeiro de 1959) o mesmo chegou a 144,08, podemos dizer que nesta data ele esteve 44,08% maior do que o valor da data de sua criação. Já em abril de 1992 o índice chegou 16,92 e agora em julho de 2010 seu índice é de 45,27.

Vivemos há 16 anos um movimento tartaruga em favor da recuperação do poder aquisitivo do salário mínimo. Quando ele foi desvalorizado caiu em velocidade de elevador e para subir parece uma tartaruga e pela escada.

Os dados do Dieese são importantes e nos informam que a economia brasileira já pagou salário mínimo muitas vezes superior aos praticados atualmente. O que impede então o retorno a valores mais substantivos?

A política.

Sim! Salário nunca foi uma definição da técnica e sim resultado da correlação de forças entre capital e trabalho. Portanto, salário tem na política sua definição. Quando me refiro ao termo política não estou reduzindo à sua dimensão eleitoral. Falo em sentido amplo do termo sem contudo desvalorizar o momento do pleito.

Reconheço que um entrave técnico-político para aumentar o salário mínimo está no fato de haver uma vinculação entre salário de mercado de trabalho com piso da seguridade/assistência social. Argumenta-se que: aumentando o salário mínimo visando atingir o mercado de trabalho, o piso da seguridade/assistência vem de carona e estoura o equilíbrio de suas contas. No entanto, com vontade política pode-se desvincular parcialmente esta trava mudando a política econômica que jorra vultosos recursos para o pagamento da dívida pública (algo em torno de R$ 380 bilhões ano) drenando-os para ajustar posições de desequilíbrio em suas contas. Pagar a dívida pública cegamente gerando uma dívida social é uma opção meramente política.

Uma política para o salário mínimo deveria levar em consideração as seguintes iniciativas cuja premissa é negá-lo enquanto piso previdenciário e a ele conferir função de política econômica: a) Salário mínimo voltado ao mercado de trabalho; b) SM reajustado semestralmente para preservar o seu poder de compra contra a inflação; c) Aumento anual do SM de acordo com a evolução do PIB (variação da riqueza nacional); d) Acelerar a recuperação das perdas históricas com aumentos periódicos em torno de 5% a 10% ao ano e por último e) criação de uma política de transição para piso da seguridade/assistência.

A economia brasileira ampliou a sua capacidade de produzir riqueza. Não só o Brasil é mais industrial em relação aos anos 50 como a forma de produzir a riqueza também mudou significativamente. Muito desenvolvimento tecnológico foi aplicado na economia brasileira (na indústria e no campo), no entanto, não houve distribuição correspondente aos ganhos do salário mínimo. Nosso pressuposto é que nossa economia comporta folgadamente uma melhor remuneração de seus assalariados. Sindicatos fortes e independentes; sociedade disposta a fazer luta pela igualdade social e estrutura jurídica menos submetida aos interesses do capital são a base para a reversão da situação.

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