04 janeiro 2009

A crise, a teoria e a luta de classes

Afrânio Boppré
Economista, professor e
membro da executiva nacional do PSOL


Imagine leitor a seguinte situação. Um jovem de 20 anos chega em casa muito constrangido mas não tem como escapar e nem deixar de assumir frente aos seus pais a seguinte notícia: papai, mamãe, preciso dizer para vocês que bati o carro num poste e deu perda total. É uma notícia que cedo ou tarde a família ficaria sabendo. Ninguém numa situação dessas consegue esconder. Foi com constrangimento relativo e com a inevitabilidade dos fatos que George Bush foi forçado a ir à cadeia televisiva e comunicar a gravidade da Crise Econômica Mundial em meio a uma eleição presidencial. Os fatos eram tão graves que sequer driblar a eleição presidencial ele conseguiu. Concretamente estava lá ele dizendo: “precisamos aprovar um pacote de ajuda no montante de US$ 700 bilhões. O que está em jogo não é a vida dos bancos mas a economia dos EUA. Ou pagamos esse preço agora ou no futuro o prejuízo será muitas vezes maior.”.

Os pais do jovem reagiram preocupados com a saúde do filho, como ocorreu, etc. e fizeram uma sabatina geral. O jovem teve a coragem de comunicar o ocorrido, mas ocultou a causa. Achou por bem, falar meia-verdade. Este também foi o procedimento de George Bush – assumiu o fato, mas ocultou a verdadeira origem da crise – o descontrole geral da economia e o fato da inerência da crise ao sistema do capital.

O presidente dos EUA, os analistas oficiais, a grande mídia e a burguesia em geral estão impedidos de explicar com a devida profundidade a natureza da crise. Mesmo que a encontrem, não podem assumir. Não bastasse o constrangimento de ter que reconhecer a existência da mesma, seria demais querer que eles admitissem o fato de se tratar de uma crise estrutural do capital. Quando muito explicam os sintomas sem falar das causas. Admitem a febre, mas negam a sua origem.

Importante ressaltar que no Brasil, o presidente Lula busca amenizar os efeitos da crise ao falar de marolinha, e assim como Bush e tantos outros esconde a causa. Lula já é classe dominante, não por ser governo, mas por estar comprometido com a lógica do capital.

Temos uma frente-única em favor da explicação falsa da crise compostas por um vasto leque de poderes (institucional, midiático, intelectual, empresarial etc.). Tudo isso está somado ao fato de que há uma natural forma de dominação das idéias, ou seja, como disse Marx, as idéias dominantes no mundo sempre são as idéias da classe dominante.

Foi Marx quem captou as leis imanentes do modo de produção capitalista, a lógica que engendra o ciclo da valorização. Dissecou os componentes constitutivos do capital, localizou a possibilidade de crises etc., e por essa razão, enquanto houver capitalismo Marx permanecerá atual e temido. A morte da teoria marxista, enquanto explicação da sociedade burguesa, está predestinada a ocorrer concomitantemente à morte do próprio modo de produção capitalista. O conjunto dos explorados e oprimidos do mundo precisa do marxismo como instrumental teórico para a explicação potente da crise e para travar o indispensável combate prático. Quanto menos marxismo assumir a classe trabalhadora mais burguesa será a saída da crise.

Sendo assim, quero também afastar a simplificação da crise como sendo um problema de cochilo do governante de plantão. Uma explicação rasa e politiqueira ao pretender “politizar” a crise culpando governos. É verdade que a saída é política mas a causa é de natureza do próprio capital.

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